ENTREVISTA/SCOTT CLELAND »
O lado B do Google
Pesquisador lança no Brasil livro que põe o dedo nas ameaças da gigante de buscas
Publicação: Jornal Estado de Minas Caderno Inform@tica - 26/07/2012 - Repórter Bruno Silva
Poucas empresas no
setor de tecnologia são tão benquistas quanto o Google, tanto por seus
serviços –, buscas, navegadores, sistemas para celular, entre outros –
quanto pela posição da empresa, conhecida por seu slogan: “não seja
mau”. Entretanto, a gigante tem seus críticos, e poucos são tão
contundentes quanto o norte-americano Scott Cleland, especialista
antitruste que já testemunhou três vezes no Congresso norte-americano
sobre privacidade e práticas anticoncorrenciais na internet. Nascido em
Michigan e defensor de direitos de privacidade e propriedade, Cleland
visitou o Brasil – e Brasília – pela primeira vez, no início do mês,
como parte do lançamento de seu livro Busque e destrua – por que você
não pode confiar no Google Inc. (Matrix Editora, 348 páginas), em que
ele destaca práticas da gigante de buscas que afetam a privacidade de
usuários, desrespeitam leis e governos – e como eles conseguem esconder
isso do público.
Existem várias empresas envolvidas em questões antiéticas no setor de tecnologia. Por que o senhor prioriza o Google?
Há
algumas razões. A primeira: o Google é único. Não há outra empresa com a
missão de organizar toda a informação do mundo e torná-la acessível e
útil. Não dá para ser mais ambicioso do que isso. Essa missão os coloca
em tudo: o monopólio da Microsoft, por exemplo, foi apenas em softwares
para PC. Isso não afetou a Apple ou a Oracle. O Google permite que eles
estejam em qualquer mercado que seja on-line – e eles estão. A outra
razão é: me pediram para testemunhar no Senado norte-americano, na época
em que o Google queria comprar a DoubleClick (a transação foi concluída
em 2007, por US$ 3 bilhões). Essa era a única empresa no mundo que
tinha o mesmo alcance em publicidade on-line que o Google. Quando me
opus à aquisição, eu era o único analista que via um problema nisso. Eu
os avisei: se a compra fosse concluída, o governo daria a eles um
monopólio. Juntas, as duas teriam uma fatia de mercado maior que a de
todos os concorrentes. No mundo dos negócios, o mais difícil é conseguir
clientes. Você não sabe como é difícil: é preciso cortejá-los,
negociar. O Google simplesmente os comprou.
Qual a diferença entre o Google e as outras empresas?
Quando
testemunhei, eles me perguntaram sobre outras empresas, como Microsoft,
Yahoo! e Facebook. O Bing, serviço de buscas da MS, é só parte do
negócio deles. A pesquisa também nunca foi o principal negócio do Yahoo!
– eles saíram, voltaram e se tornaram uma empresa de mídia. Naquela
época, o Facebook nem era tão conhecido. O Google prevaleceu sobre todos
os concorrentes quando descobriu que a publicidade em buscas e em
anúncios era o mesmo negócio. São os mesmos usuários, os mesmos clientes
e o mesmo conteúdo. Quando aprovaram a compra, sabia que o Google seria
um grande problema. Nunca tivemos um monopólio que fosse global e em
todos os mercados. Eu sabia das ambições deles, e sabia que eles eram
antiéticos. Conhecia o modo como eles se comportavam havia cinco, seis
anos e que eles continuariam assim.
A atitude da empresa motivou o senhor a escrever o livro?
Sim.
O livro é parte de quatro anos de pesquisa. Eu era uma das poucas
pessoas que sabiam que isso era um problema e estava vendo-o se
desenvolver. Eu sabia que ninguém escreveria esse livro e assim descobri
que tinha algo único a oferecer. Claro, já havia lido todos os livros
escritos sobre o Google, e eles são excelentes, mas em todos os autores
cooperaram com a empresa e contaram a história deles. Não estou tentando
diminuir o que o Google conseguiu, mas sim colocar isso em perspectiva
com todo o contexto. Um bom exemplo é o caso do Google Livros. Quando
foram acusados de roubar vários livros, eles alegaram que estavam
criando uma biblioteca global. É assim que o Google pensa: eles acham
que suas boas ações são uma licença para fazer o que querem.
Qual a visão pessoal do senhor em relação ao Google?
Acredito
em privacidade e em direitos de propriedade. O Google não. Meu ponto de
vista é: se você não tiver segurança e privacidade on-line, alguém pode
ser seu dono. Eu discordo do Google. Acho que o que eles fazem é
errado.
Por que o senhor acha que o Google tenta esconder tanto esse outro lado da empresa?
Eles
sabem que a maioria das pessoas acha que a privacidade é importante,
propriedade é importante, mas também não há ninguém melhor do que eles
em relações públicas. Quem acompanha o setor de tecnologia sabe que o
Google anuncia seus produtos muito antes de eles chegarem ao mercado,
com grande alarde, e todo mundo cobre, porque é uma empresa legal e
inovadora. Eles vieram do nada para se tornar a marca número um do mundo
em 11 anos sem gastar um centavo em publicidade, e isso é incrível. E
eles sabiam o que estavam fazendo. Eles queriam que todos confiassem
neles. Tudo que peço a eles é que sejam honestos e tão éticos quanto
dizem para o mundo.
Como as práticas do Google são vistas pela Justiça norte-americana?
Eles
estão começando a ter uma visão clara sobre isso. No último ano e meio,
muitas coisas aconteceram, principalmente em 2011, quando houve um
acordo judicial em que o Google foi obrigado a pagar US$ 500 milhões,
porque eles estavam promovendo propaganda de drogas ilegais nos Estados
Unidos, como esteroides e analgésicos proibidos. O governo
norte-americano armou um esquema em que uma pessoa fez um site que
vendia esses produtos e o Google os ajudou com informações sobre como
burlar as regras. Esse vendedor tinha uma escuta, e os agentes ouviram
tudo. Além disso, eles descobriram que Larry Page sabia disso.
Como o Google trata seus usuários?
O
Google diz que somos consumidores, mas a verdade é que os usuários são o
produto que eles vendem como propaganda. Isso não é um problema, se o
Google disser que esse é o negócio deles. Por que me preocupo tanto com a
mentira e a enganação? Se o usuário acha que pode confiar na empresa,
ele baixa a guarda. A primeira linha de defesa, para nos proteger do
perigo, é ter um ceticismo saudável. O Google diz para não nos
preocuparmos, que eles não farão nada para nos causar mal – mas eles têm
feito.
Qual a visão do senhor sobre o Facebook? A rede não tem feito o mesmo que o Google?
Sim
e não. O Facebook tem grandes problemas de privacidade, mas sua missão é
diferente. Eles querem conectar o mundo, serem sociais. Isso é apenas
um pedaço da torta. O Google quer a torta inteira. Apesar de seus
problemas com privacidade, o Facebook não rouba propriedade intelectual.
Não os estou defendendo, mas acho que em cinco anos eles serão como o
Yahoo! ou o MySpace. Não como o próximo Google. Quando observo os dois,
vejo que o Google é um jato e o Facebook é um avião com hélice. Ele é
bom, fará sucesso, mas não há comparação.
E o Google+? É uma ameaça ao Facebook?
Todo
mundo diz que o Google+ é uma cidade fantasma, mas 250 milhões de
pessoas o usam atualmente. O Facebook levou cinco anos para chegar a
esse número, talvez mais. O Facebook não é uma ameaça ao Google, e sim o
contrário. Eles não competem diretamente, mas o Google pegou seus cerca
de 500 produtos e serviços e os integrou a um único perfil social. O
efeito de rede (a tendência de um produto de alta tecnologia aumentar
seu valor à medida que ele é mais utilizado) do Google é muito maior que
o do Facebook.
Como o senhor vê o futuro se o Google continuar a não obedecer às leis?
É
um futuro muito ruim. O que engenheiros fazem? Programar. Um programa é
um plano. Quando você é engenheiro, sabe qual será o resultado dos
algoritmos e das equações, com um propósito em mente. Há um plano, um
objetivo. Ao escrever o capítulo do livro sobre recomendações e
previsões, vi que o Google tem um plano e toda vez que eles fazem isso
têm um propósito em mente. Além disso, ninguém nunca coletou toda a
informação do mundo em um lugar só. A mensagem do livro é: nós
conhecemos a natureza humana. Poder corrompe e o poder absoluto corrompe
absolutamente – é uma frase famosa de (barão inglês) Lord Acton.
Sabemos que a natureza humana não pode ser confiada se você tem poder
demais. O Google monopolizou o mundo virtual e não tende a reconhecer
fronteiras virtuais. Isso é um problema.
Isso se traduziria, por exemplo, na posição do Google em não bloquear sites e resultados de buscas a pedido do governo chinês?
Não
vou defender a China, mas quando o Google se colocou contra o governo
chinês, o que eles queriam é que todos olhassem para a empresa e vissem:
“Nós estamos nos colocando contra a China, somos ótimos”. Mas a empresa
não diz que foi hackeada fortemente pelos chineses. Eles se recusaram a
bloquear as buscas, porque o governo chinês entrou no sistema deles e
roubou todas as senhas. O Google disse a parte boa, mas não a parte ruim
– que os hackers chineses entraram no Google.
O senhor usa algum produto do Google?
Eu
uso Bing (ferramenta de buscas da Microsoft) na maior parte do tempo.
Se não consigo achar, e não ligo para que o Google saiba, eu uso a busca
do Google. Sei que tipo de informação eu estou disposto a dar a eles.
Mas acho que produtos como o Chrome são um erro. Tudo que passa por lá é
“fotografado” pelo Google. Eles veem tudo. Tudo que você faz no Chrome é
visto por eles. E, como é o mais rápido, é o mais usado. Além disso, o
Google paga a Mozilla (dona do Firefox) cerca de US$ 900 milhões para
que eles coloquem o Google como opção padrão de busca. Quando você junta
os dois, você tem mais de 50% do mercado.
Como o Google é visto no Vale do Silício?
O
Google é faminto por atenção. Eles são como a Paris Hilton do mundo da
tecnologia. Eles também coletam inimigos. Steve Jobs era o mentor de
Larry Page e Sergey Brin. Antes de o Google contratar Eric Schmidt como
CEO, eles queriam Jobs. Ele recusou o convite, deu um tapinha nas costas
de ambos e os colocou sob sua proteção. O Google mordeu a mão que os
alimentou.
Clique
aqui para conferir o site do livro de Scott Cleland
Conheça Scott Cleland, o inimigo nº 1 do Google
O Google está em todo lugar e sabe o que você está fazendo
agora. Conheça o homem que já escreveu um livro e depôs no Senado
americano contra uma das empresas mais admiradas no mundo
por
João Mello - Revista Galileu- 06/07/2012
Depois não vai falar que o Scott não te avisou... //Crédito: Reprodução
Imagine
a internet como um planeta. Imagine que esse planeta está sob domínio
de um ditador malévolo, um facínora completamente louco por poder e
onipresente. Medonho, não? E se esse tirano soubesse tudo –
absolutamente tudo – sobre você? Não haveria escapatória. Esse cenário
apocalíptico não é uma previsão aterradora do futuro, mas uma
constatação empírica sobre o que estamos vivendo nesse exato segundo. Ao
menos na visão de Scott Cleland.
O economista
norte-americano dedica sua vida a mostrar que o Google não é a empresa
boazinha que o senso comum costuma crer. Ele diz que nenhuma empresa em
toda a História foi tão poderosa e ao mesmo tempo tão repleta de
interesse de conflitos. Pra ficar com um exemplo: eles acham o que você
procura, mas, sempre que possível, os primeiros resultados serão de
produtos do próprio Google. E isso quase sempre é possível: “Eles já
criaram, literalmente, 500 produtos em quase todas as áreas que você
pode imaginar. E acham que ninguém pode fazer melhor que eles ”ele diz. A
arrogância com que trata os concorrentes, a própria ausência de
concorrentes – “95% dos brasileiros fazem buscas pelo Google!” – e a
falta de transparência em relação ao que, afinal, eles vão fazer com
informações pessoais de bilhões de pessoas, são os principais alvos de
Scott.
Ele mesmo não consegue fugir da gigante da
internet em seu dia a dia. “O Google é brilhante e muito inovador. Não
digo para as pessoas não utilizarem. Só digo para não confiarem”, ele
diz com bastante frequência. Agora em julho chegou ao Brasil o livro de
Scott: “Busque e Destrua”. A obra é uma compilação, item por item, de
notícias, estatísticas, processos jurídicos e curiosidades que mostram o
lado escuro da empresa. Se a opinião de Scott às vezes resvala na
típica paranóia ianque, é porque o tamanho do poder do Google dá margem
pra isso. Muita margem.
Confira abaixo como foi nossa conversa com Scott:
Antes de começar a entrevista, você comentou que o Google acha que todos nós somos idiotas. Por que você diz isso?
Scott Cleland:
O Google acredita que sabe tudo. Eles são brilhantes, muito inovadores,
fazem coisas maravilhosas. O problema é que eles são muito arrogantes e
acreditam que sabem o que é melhor para todo mundo. Você vê o Google
criando produtos em quase todas as direções: eles acham que tudo que os
outros já fizeram, eles podem fazer melhor. E, de fato, eles fizeram
algumas inovações espetaculares...
Quais seriam essas coisas maravilhosas, que você admira o Google por ter feito?
Scott Cleland:
Bem, eles já criaram, literalmente, 500 produtos em diversas áreas:
e-mail, livros, vídeos, viagens. Agora, até um carro que se auto- dirige
eles querem fazer! Sequenciamento de DNA, impressão digital,
reconhecimento facial...quase tudo que você conseguir pensar, o Google
estará trabalhando naquilo. E, normalmente, eles acham que ninguém faz
essas coisas melhor que eles.
E isso não é verdade?
Scott Cleland: Não.
Essa arrogância é que cria muitos problemas. Tem uma palavra em inglês,
hubris (confiança excessiva), que eu chamo de goobris. Eles são a
empresa mais ambiciosa e prepotente que nós já vimos.
Imagino
que você ouça essa pergunta o tempo todo, mas eu não posso deixar
passar a oportunidade. Quando você precisa procurar por algo na
internet, a que site você recorre?
Scott Cleland:
Normalmente eu uso Bing. Se mesmo assim eu não achar, posso dar um
Google. Eu não digo que o Google é de todo o ruim, o ponto é que eles só
contam o lado bom. E tem um lado ruim, tem muitas coisas erradas. E o
meu livro é o primeiro a contar o outro lado da coisa. Não estou dizendo
que as pessoas nunca devem usar o Google: elas não podem é confiar no
Google.
E se você está na frente de um computador e bate aquela vontade de ver um vídeo, ouvir uma música. Como você foge do Youtube?
Scott Cleland:
Se só está no Youtube e eu não me importo que o Google saiba, eu
assisto lá mesmo. Acontece que as pessoas precisam saber que o Google
grava tudo. A internet é uma imensa máquina de copiar e tudo que fazemos
na internet o Google pode rastrear, de um jeito ou de outro. O problema
é que eles foram os primeiros a perceber que a internet pode copiar
tudo. E daí, a missão deles é organizar toda a informação do mundo. Isso
inclui sua informação privada, sua propriedade privada. E eles não
pedem sua permissão pra isso.
Você pode explicar qual o critério usado pelo Google para mostrar os resultados de busca?
Scott Cleland: Eles
sabem o que você procurou antes, quais sites entrou, o que você leu,
quais notícias você deu uma olhada. Eles sabem tudo sobre você: o que
você quer, o que você pensa, o que você assiste, o que você quer fazer,
aonde você quer ir. Eles sabem tudo isso, então os seus resultados não
serão iguais aos meus. Isso pode ser bom, mas pode ser ruim. Há quem não
ligue para a privacidade, mas os que se importam não têm a opção de
tê-la.
Quando você cria uma conta no Gmail, em nenhum momento aparece um pedido de autorização para isso tudo?
Scott Cleland: Bem,
originalmente, o Google tinha uma configuração de privacidade para cada
produto seu. Em janeiro, eles unificaram tudo. A razão pela qual a
União Europeia e alguns estados dos EUA estão reclamando é que não foi
oferecida ao usuário a opção de recusar isso. Eles dizem “agora vou
combinar todas as informações que tenho a seu respeito” e não te deixam
dizer não. Eles deveriam deixar.
Se eu deletar minha conta no Gmail, aquela informação toda será, de fato, apagada?
Scott Cleland: Nós
não sabemos. Quando Google coleta a informação do mundo todo, eles
fazem três cópias. Então, não sabemos se eles apagam todos esses dados.
E como o Google usa minhas informações para lucrar?
Scott Cleland:
Eles estão no ramo da propaganda. Eles gostam de dizer que trabalham
para os usuários, mas usuários não pagam nada pra ele. Não há nada
errado com o ramo da publicidade. Mas eles dizem “Nós somos éticos,
somos confiáveis, nosso slogan é: Dont´Be Evil (Não seja mau)”. Porém,
eles têm um histórico de fazer muitas, muitas coisas erradas. Eles dizem
que não tem um conflito de interesses, mas nenhuma empresa, em toda a
História, teve mais conflitos de interesse do que eles.
Então eles pegam o mercado de propagandas, juntam com todas as informações do mundo e criam um negócio novo?
Scott Cleland:
Exato. E o problema é que eles são um monopólio global: 95% dos
brasileiros fazem busca pelo Google. Ou seja: o mercado de buscas é
totalmente controlado por eles. O Google está sendo investigado por
autoridades antitruste nos EUA, Europa, Índia, Coreia do Sul, Argentina e
também há algumas reclamações aqui no Brasil. Os produtos do Google são
os primeiros a aparecer na lista de resultados. Por que isso é
importante? Os dois primeiros resultados pegam 50% do mercado. O mundo
inteiro fica com o resto. O povo brasileiro deve se perguntar: nós
queremos que nossa cultura seja filtrada e organizada pelo Google?
Você consegue nos dar uma noção da quantidade de informação coletada pelo Google?
Scott Cleland: É
difícil até de imaginar, mas deixe eu colocar dessa maneira: toda a
informação que já foi criada no mundo, do início dos tempos até o ano
2000, tinha 5 petabytes de tamanho. O Google copia 5 PB de informação a
cada dois dias. As pessoas não têm ideia de como essa informação é
poderosa.
Qual o próximo grande passo do Google?
Scott Cleland: O
próximo grande lance é bem perturbador: o nome é Google Now. Agora que
eles têm informações de todo mundo, eles acham que pode ser útil dizer o
que você deve fazer. Isso pode ser uma boa ideia para várias situações.
Você está aqui e quer uma pizza: onde está a pizzaria mais próxima?
Isso poderia ser algo simples e prestativo, mas eles também podem te
dizer que emprego você deveria ter, o que você deveria fazer hoje. Isso
pode ser muito perturbador quando eles sabem tudo sobre você. Eles podem
sugerir :“Sabe, aquele amigo seu está logo ali do lado. Você não quer
encontrá-lo?”. O CEO da Google disse que a política deles é chegar em
cima da linha do perturbador e não ultrapassá-la. Bem, eles cruzam essa
linha – e muito! E se eles resolverem decidir em quem você deveria
votar? Ou como você deveria usar o dinheiro da sua aposentadoria? Eles
podem dizer para você investir em uma empresa...que tal o Google?
O quão perturbador o Google Now pode ser?
Scott Cleland: Ninguém
se dá conta de quanta informação eles têm. O que você faz, quais suas
amizades, o que você assiste, o que você lê, onde você estava, para onde
você pretende ir. É o tipo de informação que a União Soviética sonhava
em ter: quais suas visões políticas, seus amigos. Eles têm mais
informações sobre eleitores do que qualquer outro órgão. Se eles
quiserem, eles podem vender essas informações e manipular uma eleição.
Eles podem não fazer isso, mas têm o poder de fazer: e o poder é algo
muito tentador de se usar quando você está sendo investigado pelas
autoridades. Faz sentido, não faz?
Nos Estados Unidos, ele já testemunhou três vezes no
Congresso sobre privacidade e concorrência na internet. Em 2001, Scott
Clealand ficou conhecido ao prever o estouro da bolha das empresas
pontocom. Recentemente ele esteve no Brasil para lançar seu livro
“Busque e Destrua – Porque você não pode confiar no Google”.
"Existem dois grandes problemas com o Google: eles
não respeitam a privacidade das pessoas e também não respeitam a
propriedade privada. E se você não tem nenhuma destas coisas, você não
tem liberdade ou segurança na internet. O Google coleta mais informações
de pessoas e empresas do que qualquer instituição jamais coletou. O
problema é que essas informações podem cair nas mãos erradas", comenta o
autor.
Segundo o pesquisador, atualmente nos Estados Unidos, o
Google é acusado por problemas de fraude, privacidade, monopólio e até
de atos criminais.
"Uma das razões de porque o Google é um
problema é porque eles não respeitam a lei. Este é um dos motivos pelos
quais escrevi o livro; as pessoas não entendem que o Google não é assim
tão confiável quanto eles se dizem ser", afirmou.
Durante a
entrevista o autor aproveitou para dizer o que significa o desenho do
dinossauro vestido com um pijama de ovelha na capa do livro.
"Todos
conhecem a expressão 'lobo em pele de cordeiro', certo? O Google
escolheu o Tiranossauro Rex como mascote da empresa. Eles inclusive têm
um esqueleto gigante de um T-Rex no prédio da companhia. Agora, que tipo
de empresa escolhe um tiranossauro como mascote? Pelo que sabemos, o
T-Rex foi o predador mais devastador e destruidor que já habitou a
Terra", disse.
E o que o Google diz sobre todas essas acusações, Scott?
"Bom,
eles ignoram minhas mensagens e também o meu livro. Claro, eles não
querem que as pessoas conheçam o outro lado da história. Eu não teria
qualquer problema com o Google se eles obedecessem as leis; se eles
fossem tão éticos e confiáveis quanto dizem ser", finaliza.
A íntegra da entrevista com Scott Clealand, o maior
crítico do Google no mundo, você confere no no link acima. Acesse e
confira tudo o que ele tem a declarar contra a gigante pontocom.
Aproveite para conhecer um pouco mais sobre o livro “Busque e Destrua” e
tire suas próprias conclusões.
A face perversa do Google
Por Ethevaldo Siqueira Estadão.com.br / Blog do Ethevaldo Siqueira – 06/06/2012
“Todos conhecem os benefícios e as coisas maravilhosas que o Google
nos proporciona. Poucos, entretanto, têm consciência dos riscos
decorrentes da destruição de sua privacidade, do rastreamento permanente
de suas consultas e do uso antiético de informações pessoais por esse
monstro digital, que indexa, armazena e manipula milhões de terabytes
por dia”.
Essas advertências são do pesquisador norte-americano Scott Cleland,
no livro Busque e Destrua (Por que você não pode confiar no Google
Inc.), que foi lançado na semana passada em São Paulo pela Editora
Matrix. Depois de ler o livro e entrevistar Cleland, acho que o mundo
deveria preocupar-se muito mais com os riscos e problemas apontados pelo
pesquisador.
O livro acusa o Google de não seguir os mais elementares padrões éticos,
como o respeito à intimidade das pessoas, à propriedade intelectual e à
honestidade das informações. E o faz repetidamente – diz Scott Cleland:
“Em 2011, a empresa pagou multa no valor de US$ 500 milhões por ter
anunciado de forma deliberada e consciente por sete anos, as importações
de um medicamento controlado ilegal e inseguro, segundo as leis
norte-americanas”.
Poder absoluto
É provável que a maioria das pessoas não se preocupe com o tamanho e o
poder do Google. Mas, para Cleland, essa corporação gigantesca assusta
porque nunca existiu empresa tão grande e tão poderosa quanto esse Big
Brother ou Grande Irmão (personagem criada pelo escritor George Orwell,
em seu livro 1984).
O poder do Google cresce de forma aterradora, adverte o autor
norte-americano. “Isso nos faz relembrar a advertência do Lord Acton (o
historiador britânico), que escreveu: O poder tende a corromper. E o
poder absoluto corrompe absolutamente.”
O Google caminha para a consolidação do pior dos monopólios em âmbito
mundial: o monopólio da informação. “É o que chamo de googlepólio. Mais
do que isso: o Google rastreia tudo que você faz online. Invade sua
privacidade e atua como uma verdadeira agência de espionagem.”
Cleland levanta questões cruciais, como esta: ”Será que os líderes do
Google – os fundadores Larry Page e Sergey Brin e o presidente
contratado Eric Schmidt – estão se afastando de sua promessa de tornar o
mundo um lugar melhor? Ou estão disfarçando com tamanha eficiência seus
verdadeiros objetivos que ninguém foi capaz de notar?”
Advertências
O livro de Scott Cleland não é uma condenação paranoica do Google,
embora escrito numa linguagem realmente dura. O que ele faz, sim, é uma
radiografia dos problemas dessa empresa global. No apêndice do livro, o
autor relaciona 726 documentos, artigos e pesquisas sobre a empresa,
seus processos e conflitos. Como especialista nos riscos da internet e
das redes sociais, Cleland já testemunhou três vezes perante o Congresso
americano.
Entre os capítulos do livro, há temas que chocam, mas sua
argumentação é consistente, com base em fatos, números e processos
judiciais. Eis os títulos desses capítulos: “O que é seu é do Google; A
segurança é o calcanhar-de-aquiles do Google; Googlepólio; Um pântano de
conflitos ocultos; Poder incontrolado; Por que o Google é destrutivo; A
estrada digital para a servidão; Para onde o Google nos está levando? O
que devemos fazer a respeito? A tirania do planejamento central; O
código Google”.
Os dois Googles
Cleland lembra que ninguém está propondo a destruição do Google, até
porque o mundo hoje depende dele. Por isso, é essencial que a empresa
corrija seus vícios e maus procedimentos. Fiscalizar, corrigir e punir
são tarefas que cabem, prioritariamente, à Justiça, ao Ministério
Público, aos governos e a todas as entidades responsáveis pela proteção
do direito dos cidadãos.
É preciso usar todos os meios de comunicação, a começar da internet,
do próprio Google e do YouTube (que pertence a essa empresa) para
esclarecer os usuários e, em especial, para advertir nossos jovens sobre
os riscos e educá-los como internautas, para que saibam utilizar as
informações ali contidas, com o espírito crítico que esse novo Leviatã
digital nos impõe. Eu e centenas de milhões de usuários sabemos quais
são os benefícios e a utilidade do Google, como maior acervo de
informações que a humanidade já produziu, ao alcance de mais de um
bilhão de pessoas em todo o mundo. E de graça.
De graça? Na realidade, essa suposta gratuidade do Google é a grande
isca para atrair audiência. A partir daí, o Google se transforma numa
gigantesca máquina de publicidade que fatura bilhões. Seus parceiros são
todos os demais sites, portais e blogs que cedem seus espaços em troca
de uma remuneração próxima de zero. Como um polvo, o Google invade e
ocupa todos os espaços livres de todos os portais, sites e blogs.
Precisamos ser sempre críticos e independentes diante do Google e da
internet como um todo, apontando seus riscos e malefícios, em lugar de
apenas ressaltar suas maravilhas.
Meu conselho é este: seja cauteloso e desconfie sempre, leitor,
inclusive dos melhores projetos colaborativos, mesmo aqueles aparente ou
comprovadamente filantrópicos e não comerciais, como a Wikipédia.
Duvide sempre, pois a internet é um oceano de armadilhas e riscos. Aqui,
mais trechos da entrevista de Cleland.
A visão de Scott Cleland
Quem é Scott Cleland? O autor do livro Busque e Destrua, lançado pela
Editora Matrix em tradução brasileira no dia 3 de julho, é pesquisador e
consultor. Fundou a Precursor LLC, empresa de consultoria que faz
pesquisas sobre o futuro da internet e de inovação em sentido amplo.
Cleland criou também a Netcompetition.org, entidade que estimula a
competição e o desenvolvimento das empresas de serviços de banda larga.
Scott Cleland não é um panfletário em busca de visibilidade e de uma
fatia, ainda que minúscula, dos imensos lucros do Google. Como
especialista em internet e Google, ele já foi convidado e compareceu ao
Congresso dos Estados Unidos para testemunhar contra o Google, a quem
acusa de ser um monopólio – aliás, “um monopólio predador”.
O especialista diz que, como todos sabemos, o Google tem muita coisa
boa, não apenas uma grande parcela de seu conteúdo, quanto seus novos
serviços. A proposta que a empresa anunciou ao nascer há 14 anos era
ajudar a humanidade a encontrar cada até agulhas perdidas no imenso
palheiro da informação do mundo. Hoje, no entanto, ela diz simplesmente
que seu propósito é organizar toda a informação do mundo.
O Google é muito mais do que um gigante de buscas de informações na
internet, mas oferece um conjunto de serviços e ferramentas, entre os
quais e-mail, a rede social, mapas, o Android (sistema operacional
móvel) e está entrando também na área de hardware.
A grande ameaça que Scott Cleland denuncia é a ameaça que o Google
significa para a privacidade de milhões de pessoas, assim como à
propriedade intelectual. Sua previsão do futuro dessa empresa é
catastrófica: “Em cinco anos poderão ocorrer desastres na área de
segurança e muitos problemas de soberania. Aliás, o Google não respeita a
soberania dos países”.
Qual é a sua avaliação do Google?
Scott Cleland – Eu diria que ele é o perfeito lobo na pele de um
cordeiro, da fábula popular. Na realidade, na capa de meu livro, a
ilustração é de um Tiranossaurus rex (o T-Rex), com pele de cordeiro,
até porque diante da sede do Google na Califórnia, há um imenso
esqueleto do T-Rex. O Google tem cara de bonzinho, mas é mau.
Que mensagem você acha que os fundadores do Google estavam tentando
transmitir aos funcionários da empresa e ao mundo ao escolher como seu
mascote não-oficial o predador mais temido e destrutivo que já existiu
na face da Terra?
Qual é a ética ou a declaração de princípios do Google?
O Google vende sua própria imagem como uma empresa confiável, ao
adotar o lema “Não seja mau” (Dont be evil), numa espécie de convite
para conquistar a confiança das pessoas. É claro que ela é uma companhia
incrível, que faz muitas coisas boas. Contudo, ela acha que o fato de
fazer o bem lhe permite fazer coisas erradas.
O Não seja mau é o padrão ético mais elementar já criado pela
empresa. No entanto, na prática, ele permite que se faça qualquer coisa,
mesmo que isso se aproxime do que é, indiscutivelmente, mau.
Todos os padrões religiosos ou éticos promovem o respeito pelas
pessoas, pela propriedade e pela honestidade. Mas o Google desrespeita
as pessoas, a propriedade e a honestidade em série. A empresa atropela a
Regra Dourada do “não faça a outrem o que não quer que lhe façam”. Ela
sempre trata as pessoas de uma forma como não desejaria ser tratada.
Na realidade, o Google significa a maior ameaça à privacidade de seus
usuários em todo o mundo e adota a uma das piores políticas de proteção
à propriedade intelectual do mundo.
Mais de 70% das pessoas que entrevistei, todas com
escolaridade de nível universitário, disseram não considerar a
privacidade um direito importante para os cidadãos, numa pesquisa que
conduzi há quatro anos. Que acha disso?
Cleland – O fato de uma pessoa não ter consciência do valor de um
direito fundamental não a isenta dos riscos que a violação desse direito
poderá trazer. É bom lembrar que o Google compilou e coletou, sem
permissão, mais informações sobre mais pessoas do que qualquer outra
entidade na história. E não presta contas para quase ninguém.
O princípio que o Google alega – do “não seja mau” –implica
moralidade, mas a empresa não tem nenhuma consideração pelas pessoas,
pela propriedade e pela verdade.
E quanto ao tamanho e ao poder do Google?
Cleland – O Google é um gigante. Ele centraliza a informação de um
modo sem precedente. Combinada com a ausência de prestação de contas e
com o desrespeito pela lei, essa concentração do poder das informações
disponíveis em todo o mundo se transforma na mais completa receita para a
tirania.
Lembre-se de que informação é poder. Como disse o Lorde Acton: “O
poder corrompe e o poder absoluto corrompe absolutamente, ou seja, de
forma absoluta”.
A Apple e sua nuvem (iCloud) também não são ameaças à privacidade?
Cleland – A computação em nuvem traz sempre alguma ameaça potencial. O
problema com o Google é que ele diz que podemos confiar na sua
segurança, mas ela é, na realidade, muito fraca. Ele não se previne de
invasões, mas só tomam providências se forem acionados, amigavelmente ou
via tribunais. Em outras palavras: só consertam a porta depois que elas
foram arrombadas. Tudo em nome de uma suposta abertura. Para o Google,
“ser aberto é o mais importante”.
O caso da Apple é diferente. Quando alguém coloca um aplicativo na
App Store, ela valida, porque eles querem ter certeza que não é um
malware, ou um aplicativo (app) ruim. O Google permite que todo mundo
entre lá e só remove as coisas ruins se houver reclamações.
Mas com a importância que o Google adquiriu em nossa vida, como podemos viver sem ele?
Cleland – É muito difícil. São, realmente, duas faces. De um lado, o
Google faz muitas coisas boas, tem ótimos produtos. De outro, eles
escondem os problemas. O que nos cabe é abrir bem os olhos e não confiar
cegamente.
Você quer fazer uma pesquisa? Tudo bem, faça-a. Ela é muito boa.
Mas quando falamos em política de privacidade, há alguns produtos que
não deveriam ser utilizados. Não use o Gmail. O que é o Google+? Ele
está fazendo o Google social e integrando tudo o que você tem em apenas
um arquivo. O grande problema que falo em meu livro é a
supercentralização. Nunca houve uma companhia tão ambiciosa, que
quisesse coletar todas as informações do mundo. Eles dizem tudo mesmo, e
isso inclui suas informações privadas também.
Que tipo de providências o mundo deve tomar?
Cleland – Primeira coisa a fazer: exigir que o Google nos trate como
devemos ser tratados. Segunda: aplicar ao Google em escala mundial a
força da lei que impeça o Google de fazer o que quer sem dar satisfação a
ninguém.
Na realidade, o Google age como se fosse uma bolha, sem qualquer
obrigação de seguir as mesmas regras e éticas que as demais pessoas
seguem.
Qual é a formação profissional dos dirigentes do Google?
Cleland – O primeiro escalão é formado só engenheiros. Esse é o
problema. A empresa reflete a visão do engenheiro. Os engenheiros do
Google deformam o mundo online. Querem impor-nos uma espécie de
igualitarismo, onde não há propriedade, não há privacidade, e ninguém
pode dizer não a ninguém.
Qual é a posição do Google diante da pirataria?
Cleland – O Google não faz pirataria, a rigor. Ele tem, sim,
interesse político e financeiro em minar o conteúdo alheio.
Paralelamente, valendo-se do monopólio de busca de fato que detém, o
Google está tentando criar seu próprio conteúdo: Youtube, Maps, Google+.
Com isso, eles querem ser os primeiros em todas as áreas, tanto em
produtos quanto em conteúdo. E ninguém consegue competir com eles. Eles
são donos do baralho, ficam com as boas cartas e distribuem as ruins
para os outros jogadores. Isso é trapaça.
Um decálogo satírico das diretrizes do Google
Cleland, já compilou até um código satírico das dez diretrizes que orientam a ação do Google. Quais são essas “diretrizes”?
1. A regra básica do Google: Quem controla as informações alheias governa.
2. A regra dourada do Google: Trate os outros da forma como a Google não quer ser tratado.
3. O relativismo moral do Google: Inferir que outros são maus faz a Google parecer ético.
4. A bússola moral do Google: “Mau é aquilo que Sergey (um dos
fundadores do Google) diz que é mau.” – Eric Schmidt, presidente ou
Chairman.
5. O código de ética do Google: “A política do Google com relação a
muitas coisas é aproximar-se ao máximo dos limites do obscuro e não
cruzá-los.” – Eric Schmidt
6. O princípio básico do Google: Se a coisa não aumenta, ela não pode ser monopolizada.
7. A lei da liberdade da Google: “Nasce um idiota a cada minuto”.
8. A lei da privacidade da Google: A análise de perfis está no olho de quem vê.
9. A lei de propriedade da Google: Tudo que é bom vem para aqueles
que se apoderam dele. Por outras palavras, apodere-se de algo para dele
obter o melhor resultado.
10. A lei da inovação da Google: Se no princípio você não obteve êxito, compre aquilo que obteve.